Epitáfio

Recentemente, o Senhor levou minha mãe. Estive com ela naqueles últimos momentos, e pedia, desesperadamente, que o Senhor lhe desse mais tempo. Mas o Senhor disse não, e a levou. E por isso O louvo por Seu amor.

Esse louvor é, por um lado, um exercício. Para que minha fé, minha confiança nesse amor, seja ampliada. Por vezes, é difícil entender as respostas que o Senhor nos dá. Ou entender a maneira como Ele responde. Por isso, senti que seria interessante compartilhar o texto abaixo, que foi o que gostaria de ter lido no velório, e foi o que acabei dizendo aos presentes, embora, dada a emotividade da ocasião, de maneira menos organizada:

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“Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai de misericórdias e Deus de toda consolação! É ele que nos conforta em toda a nossa tribulação, para podermos consolar os que estiverem em qualquer angústia, com a consolação com que nós mesmos somos contemplados por Deus.” (1 Co 1:3-4)

Por convicção pessoal, não vejo este ajuntamento como uma forma de honrar minha mãe, de demonstrar-lhe carinho ou afeição. Creio que a oportunidade de honrá-la, de confortá-la e manifestar apreço sessou no dia em que o Senhor a tomou para Si. Nosso ajuntamento é para consolar os que ficam. É para que tenhamos a percepção de que a dor que sentimos, não a sentimos sozinhos. É para chorarmos juntos. É também para atenuarmos a dor com a consolação da esperança que temos em Cristo.

Eu agradeço sinceramente a presença de cada um, e também as muitas manifestações de pesar e apoio que recebemos nesses dias. A presença de cada um aqui, cada palavra de conforto, cada boa lembrança que ouvimos, reafirma nossa consolação de que minha mãe viveu plenamente, de que lutou o bom combate e completou a carreira que lhe estava proposta. Provam que não lhe faltaram dias para cumprir o grande mandamento, de que amemos ao próximo como a nós mesmos.

Essa é a marca, o testemunho da vida de minha mãe. Amou a Deus de todo o seu coração. Gastou-se por seus filhos, por sua família, por seus irmãos na fé, por seus alunos tão especiais. Ela se preocupava sinceramente com todos os que a rodeavam (na última conversa que tivemos, nos últimos minutos que tivemos juntos, ela me pedia que trouxesse roupas de bebê para doar para o jardineiro
que trabalhava em sua casa).

Mas esse amor não era irresponsável, ou vazio. Ela sabia muito bem e ensinou muito bem o significado da justiça, da lei. Aliás, a frase mais célebre da Dona Loide, que ouvi por toda a minha infância foi: “a lei é para aqueles que não vivem pelo Espírito. E pra vocês, eu sou a lei”. Creio que o grande feito, o ápice do testemunho dela, que eu agora invejo, foi que, para cada um de nós, a lei que nos limitava e influenciava exteriormente, foi eficaz para nos guardar e, em algum momento, conduzir à graça, que hoje nos define e move interiormente.

Dar esse testemunho não visa cobrir, evidentemente, as muitas falhas e pecados que, naturalmente, todos os filhos de Adão carregam. Esses foram cobertos pelo grande amor de Deus, manifestado de forma indubitável pelo sacrifício eterno do sangue de Seus Filho, derramado por nós na cruz. “(…) porque o amor cobre multidão de pecados” (1 Pe 4:8).

Diante desse testemunho, meu desejo é que não apenas vejamos uma vencedora, alguém que tem agora a corôa da vida, e nos consolemos com isso. Mas principalmente que possamos aprender com alguém que imitou a Cristo, para que possamos imitá-la e seguirmos com convicção ainda mais firme nossa jornada, amando a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos.

Por isso, peço ao Senhor que as boas lembranças, da forma como ela amava a todos, de como se preocupava com todos, de como acolhia a todos como filhos, se tornem um encorajamento para que façamos o mesmo. Peço que eu também alcance tamanha graça e veja minha filha encontrar o Senhor que tanto amo.

Peço, ainda, que, a despeito de todo o pesar, confirmemos nossa confiança no amor de Deus  e que, arraigados e alicerçados nesse amor, possamos declarar, com sinceridade, as mesmas palavras proferidas por Paulo, nosso irmão na fé, há quase dois mil anos:

“Porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos. Quer, pois, vivamos ou morramos, somos do Senhor”
(Rm 14:8)

 

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