Um ano e pouco de paternidade (2)

Recentemente escrevi sobre como o nascimento de minha filha me fez ver o amor de Deus com novos olhos. O nascimento dela, desde a gestação, também me fez ver a vida cristã com novos olhos. Minha esposa e eu, pais de primeira viagem, ficamos muito empolgados já nos primeiros dias de gravidez. Fomos logo fazer uma ultrassonografia e, para nossa decepção, não vimos nada. Ou melhor, não vimos nada do que esperávamos: havia apenas um saco gestacional.

Então, considerando a frágil vida humana como um tipo, uma figura, da vida nova, superior e indissolúvel que recebemos como filhos de Deus, entendi que a vida cristã não começa com o cristão: ela começa com o ambiente onde o cristão é gerado. De onde o cristão recebe nutrientes, onde é guardado, preparado. E o Espírito me fez entender que esse “lugar” é Cristo.

pois, nele, foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele. Ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste. Ele é a cabeça do corpo, da igreja. Ele é o princípio, o primogênito de entre os mortos, para em todas as coisas ter a primazia,”
(Cl 1:16-18)

“aboliu, na sua carne, a lei dos mandamentos na forma de ordenanças, para que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem, fazendo a paz”
(Ef 2:15)

“Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua muita misericórdia, nos regenerou para uma viva esperança, mediante a ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos”
(1 Pe 1:3)

“Fomos, pois, sepultados com ele na morte pelo batismo; para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também andemos nós em novidade de vida.”
(Rm 6:4)

Parece óbvio, mas a dificuldade que temos em praticar, em experimentar, isso mostra que muitas vezes não entendemos que tudo na vida cristã começa em Cristo, que a novidade de vida é resultado de nossa união e proximidade com Ele. O crescimento começa em Cristo. Os frutos do Espírito têm sua origem Nele. A vitória sobre nossas muitas falhas de caráter começa Nele. Mas, mesmo sabendo disso, Cristo continua sendo o último recurso. Como bons cristãos, geralmente nos policiamos em muitos assuntos. Nos exercitamos na busca da piedade, buscamos sabedoria e, quando percebemos que é impossível recorremos a Ele.

Continuando a história da Tirza: Talita e eu, pais empolgados, voltamos na semana seguinte e, para nossa alegria, na segunda ultrassonografia vimos o que viria a ser a Tirza. Naquele momento era um minúsculo coraçãozinho, pulsando freneticamente. Então aprendemos que em torno daquele coraçãozinho um sistema nervoso se desenvolveria, e, com o desenvolvimento do sistema nervoso os outros sistemas se desenvolveriam até que, em torno daquele coração, houvesse uma pessoinha completa.

O escritor de provérbios, inspirado pelo Espírito Santo, escreveu:

“Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o coração, porque dele procedem as fontes da vida
(Pv 4:23)

Ao acompanhar a formação da Tirza passei a ter uma percepção completamente diferente desse versículo. Eu sempre tomava essa passagem como uma orientação no sentido de que meu coração deveria ser enchido daquilo que edifica, daquilo que traz vida. Isso estaria intrinsecamente ligado à orientação de guardar um bom depósito (2 Tm 1:14). Mas não é apenas uma questão de “controlar o acesso” ao coração, de receber apenas coisas boas, edificantes, espirituais. A questão é ter um coração novo, bom, espiritual. O coração é a fonte da vida por que é em torno do coração que se forma o homem, que se forma toda a vida que vivemos. Um homem novo, espiritual, procede de um coração novo, espiritual.

Dar-vos-ei coração novo e porei dentro de vós espírito novo; tirarei de vós o coração de pedra e vos darei coração de carne. Porei dentro de vós o meu Espírito e farei que andeis nos meus estatutos, guardeis os meus juízos e os observeis.”
(Ez 36:26-27)

“seja, porém, o homem interior do coração, unido ao incorruptível trajo de um espírito manso e tranqüilo, que é de grande valor diante de Deus.”
(1 Pe 3:4)

“Porém judeu é aquele que o é interiormente, e circuncisão, a que é do coração, no espírito, não segundo a letra, e cujo louvor não procede dos homens, mas de Deus.”
(Rm 2:29)

O coração, evidentemente, tem uma conotação subjetiva. Está relacionado aos desejos mais profundos, aos anseios, às preferências. É em torno dessa identidade mais profunda que se formam nossas convicções. E é dela que partem as decisões que mais impactam nossa vida e a vida daqueles ao nosso redor. A partir do coração formou-se o sistema nervoso da Tirza, e, com o sistema nervoso, tudo aquilo que comporia uma nova pessoa. Assim também, a partir do meu coração desenvolvem-se minha mente, minhas convicções, vontades e escolhas e, consequentemente, meus hábitos. Um coração novo leva imediatamente a uma mente nova, a essa mente a um novo homem com um novo viver. O fruto da renovação do coração é uma vida nova, que experimenta a agradável, boa e perfeita vontade de Deus.

“Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”
(Rm 12:1-2)

Enfim, a maneira miraculosa como a Tirza foi gerada me mostrou que preciso estar em Cristo. Nele, um coração novo é criado. Um coração novo gera um novo homem, habilitado a experimentar a vontade de Deus, pronto para as boas obras, as quais Ele preparou de antemão para andássemos nelas. Quantas lições nessa pequena vida!

“Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas.”
(Ef 2:10)

 

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